EPIFANIA #6: Ásia, softpower e o funk brasileiro
Olá, epifânicos! Bem-vinde à edição #6 da EPIFANIA.
Depois de um bom tempo, voltei!
Estava ensaiando para escrever essa newsletter há tempos. Tudo começou com um post no twitter da abertura das Olimpíadas de Pequim em 2008 e um papo de boteco com a esposa do meu chefe.
Ela morou na China e contou como acompanhou a evolução tecnológica bizarra do país a partir do final dos anos 1990. Com o mundo voltando seus olhos pra China nessa dinâmica internacional entre EUA-Trump dos últimos tempos, resolvi tirar essa ideia do papel, além de trazer essa perspectiva para o Brasil.
Espero que gostem!
Para quem não sabe, eu sou muito fã de cultura asiática, principalmente China, Japão e Coreia do Sul. Começou oficialmente na pandemia e acabou fincando os pés em todos os âmbitos da minha vida. Não só da minha. Mas, com as situações da introdução desta newsletter, comecei a ficar particularmente interessada em como esses países usam do softpower para influencier outras sociedades através da cultura e entrar de vez no nosso cotidiano.
Se você nunca ouviu falar sobre esse conceito, softpower é basicamente uma estratégica política-econômica para influenciar indiretamente o comportamento ou interesses de outros corpos políticos por meios culturais ou ideológicos.
Em poucas palavras: uma forma do Estado exercer seu poder.
O Estados Unidos faz isso muito bem. A língua mais falada no mundo é inglês, os artistas mais vendidos e mais bem-pagos também são norte-americanos. Mas é curioso perceber como países com línguas tão diferentes para nossos ouvidos também conseguem fazer isso e o fazem brilhantemente através da cultura.
E sobre esse tópico, claro, estamos falando da Coreia do Sul. Com certeza, você sabe. O K-pop, os K-dramas, os produtos coreanos de maquiagem. Esse fenômeno tem um nome oficial - Hallyu - que é justamente essa disseminação da cultura sul-coreana a partir dos anos 1990, que ao fazer tanto sucesso, atraiu os olhos dos governantes, que viram potencial de um investimento pesado na indústria do entretenimento.1
Comentei das Olimpíadas no começo porque esse evento é o exemplo perfeito de demonstração de softpower, já que nela, nós conseguimos adentrar no estilo de vida, nos valores culturais, entretenimento e, claro, no esporte.
A China fez isso em Pequim, porque o softpower foi visto como uma ferramenta que poderia ajudar a mitigar, a longo prazo, a teoria da "ameaça da China", bastante difundida não apenas regionalmente, como também globalmente.2 Foi a forma de mostrar a China de uma nova perspectiva. Culturalmente instigante, cheia de tradições antigas, e ao mesmo tempo, moderna.
Isso não significa uma perda de poder dos Estados Unidos. Trump está aí para provar. Mas, é interessante perceber uma evolução gigante nesse curto período. Ao me aprofundar nesse assunto, acabei chegando em um estudo de pesquisa do mundo sobre percepções das ‘marcas nacionais’, chamado de Index Global de Softpower3. Se você ficou curioso com o material, pode acessar mais dele aqui. É bem legal.
E o Brasil?
Nosso país já foi sede de diversos eventos importantes, mas nunca existiu um projeto de Estado estruturado responsável por tornar a cultura brasileira como esse instrumento de softpower. Quando angulamos para música, houve esse movimento com a bossa nova, mas depois disso, nada.
Isso não significa que não aconteça. O que quero mostrar aqui é que acontece - não por meios governamentais - e sim, por uma movimentação mais orgânica e esforço dos próprios artistas.
O funk é o exemplo mais claro disso. É o gênero brasileiro mais escutado fora do país4, mas ainda não é considerado um ativo de softpower e sabemos bem os impedimentos de usá-lo como essa ferramenta cultural tão potente: uma música periférica, de favela e negra, marginalizada dentro do próprio território.
O Estado brasileiro nunca entendeu diversos itens culturais como ativos, porque para entender, precisa olhar de baixo pra cima. É aquilo de “voltar pra base”, que o Brown falou há anos atrás. Acredito que o mais importante de tudo é saber que o funk - e outros aspectos da nossa cultura - nunca precisou e nem vai precisar de plataformas do Estado para ter sucesso.
PS: vale lembrar que não sou nenhuma especialista no assunto. Apenas curiosa. Fique a vontade para discordar.
Continuo presa no brazilian boogie. Esse é um dos meus álbuns favoritos da Sandra de Sá. Tenho até uma história engraçada com essa música: uma vez, toquei na Fatiado Discos com minha parceira Carol e foi uma época que eu estava completamente viciada nesse álbum e em especifico, nessa faixa.
Na hora que eu fui trocar de disco para próxima música, estava com essa música na cabeça. Procurei loucamente esse disco no case e nada. A outra música quase no final. Pista cheia. Desespero de deixar a pista em silêncio. Demorou até eu lembrar que estava procurando um disco que eu não tenho (risos).
[Para acompanhar]
EPIFANIA ESTREIA NA FUNCTION.FM | Depois de muito tempo, finalmente a EPIFANIA vai se transformar em um programa de rádio e a estreia acontece no dia 15/05 (quinta-feira) às 14h. Acompanhe @epifaniaproject & @function.fm
[Para conhecer]
ÁGUA E BISCOITO BAR | um novo listening bar ali na Barra Funda, cujo nome faz piada com o passado do ponto: era alugado por bandidos que fingiam que o espaço era uma distribuidora de água e biscoito, mas na verdade, estavam usando o lugar para abrir um túnel a partir dali.
[Para assistir]
BELAS SONORIZA: AMOR À FLOR DA PELE | Finalmente, chegou meu momento. Para celebrar os 25 anos do lançamento, Belas Artes vai sonorizar ao vivo o filme Amor à Flor da Pele, dirigido pelo - meu diretor favorito - Wong Kar-Wai. Vale a pena!
Barros II, João, et al. "Hallyu como instrumento de soft power sul-coreano." Campos Neutrais-Revista Latino-Americana de Relações Internacionais 5.2 (2023). pg: 42 (Link)